Review | Life is Strange 2 – Episódio 1

Três anos atrás, mais especificamente no dia 30 de Janeiro de 2015, o estúdio francês Dontnod chocava a indústria de Jogos com o genial Life is Strange. Protagonizado por Maxine Caulfield, o jogo contou uma história poderosa de maneira inovadora e realista, conquistando diversos prêmios e uma base de fãs colossal. Agora, 3 anos após o original, Life is Strange 2 chega ao mercado com novos personagens e uma história devastadora e atual, servindo como um tapa na cara para o atual governo norte-americano.

Sobre Meninos e Lobos

Diferente do primeiro jogo, Life is Strange 2 conta com dois protagonistas, os irmãos Sean e Daniel. Sean, o mais velho e já perto de terminar o colégio, age como todo adolescente com problemas agiria. O que assusta no jogo é a precisão com que o estúdio conseguiu replicar esse comportamento. O personagem foi tão bem construído que muitas vezes me vi perguntando se realmente se tratava de um personagem fictício. Quando tinha 8 anos de idade, Sean viu sua mãe ir embora, deixando ele e o irmão sob os cuidados do pai, Sebastian. Por conta desse abandono, Sean acabou tendo mais responsabilidades do que uma criança normal teria, ficando sempre responsável pelo seu irmão Daniel. No começo do jogo vemos um Sean dividido entre conquistar sua liberdade com as responsabilidades de cuidar de seu irmão caçula.

Daniel é basicamente o oposto de Sean. Como ainda era um recém nascido, ele não sentiu a ausência da mãe e cresceu em um ambiente seguro. Dan sempre foi protegido e mimado pelo irmão e pelo pai, desenvolvendo um coração bom e uma personalidade bem ingênua. Os dois personagens ficaram bem críveis e a relação entre eles foi muito bem pensada. Sean, por ser o mais velho, acaba servindo como um mentor e inspiração para o irmão caçula. A medida que os dois partem na Jornada, diversos acontecimentos testam o laço entre eles, entregando um simulador extremamente preciso de como funciona uma irmandade. É nesse momento que os dois se aproximam de lobos, com Sean atuando como o Lobo Alfa e Dan como o Beta. Muitos perigos existem nas estradas norte-americanas e cabe a eles cuidarem um do outro. Um elemento notável é que apesar das dificuldades da estrada, as brincadeiras e os momentos de irmãos ainda existem, alavancando o sentimentalismo provocado pelo jogo. Diferente do game antecessor, Life is Strange 2 não demora nem 20 minutos para engatar e claro, para fazer os jogadores chorarem com uma das cenas mais chocantes dos jogos nos últimos anos.

Derrubando o Muro

Life is Strange 2 critica explicitamente as políticas do atual governo norte-americano em relação aos imigrantes. A família que protagoniza o jogo, os Diaz, são mexicanos que imigraram para a terra do Tio Sam. Apesar de já terem conquistado a cidadania, o preconceito ainda existe e fica escancarado logo no começo do jogo. O game faz constantes referências a políticas do governo e até mesmo a ideias de Donald Trump, o atual presidente do país. O polêmico Muro do México não fica de fora das críticas. O estúdio também critica a violência policial que existe no país, sendo evidenciada numa cena que, pra mim, foi uma das mais chocantes que já vi em um jogo nos últimos 5 anos. Além de um visual bem impactante, a cena se potencializa graças a trilha sonora magnífica do jogo, gerando inquietação, falta de ar e uma profunda dor no peito.

O estúdio francês não poupou esforços para chamar a atenção dos jogadores e da mídia sobre um dos principais problemas da América do Norte, mas o primeiro episódio não se apoia somente em críticas a políticas predatórias. Ele também humaniza os imigrantes e escancara que eles são pessoas comuns/”iguais” a quaisquer outras. A sacada genial do estúdio foi colocar os dois irmãos numa Jornada para voltar ao México, enquanto que na realidade, o comum é que mexicanos tentem atravessar a fronteira com o apoio de coiotes. Em Life is Strange 2, o signo paraíso não é o EUA, mas sim o México, funcionando como um tapa na cara genial e necessário diante da realidade atual dos dois países.

Escolhas, Escolhas

As escolhas em Life is Strange 2 não alteram somente a trama, mas a relação entre os irmãos. A verdade é muito importante para Daniel e coisas ruins podem acontecer caso ele descubra que Sean mentiu pra ele. Assim como no jogo antecessor, o sobrenatural marca presença em forma de um poder misterioso. O pequeno Daniel lembra bastante um Jedi, podendo levantar objetos ou causar explosões de “força” em momentos de grande estresse. Diferente de muitos jogos narrativos, em Life is Strange 2 não existem escolhas certas ou erradas, existem apenas escolhas. Cada uma terá um desdobramento e algumas dessas consequências só irão aparecer nos próximos episódios.

Em alguns momentos da trama, o jogador vai avistar elementos que podem ativar momentos especiais entre os irmãos, no entanto, é recomendável avaliar toda a situação antes de fazer determinadas escolhas. Fazer todas as vontades de Daniel fará com que ele se torne ainda mais dependente, gerando consequências na história. Além de afetar o laço entre os irmãos, as escolhas também determinam os suprimentos disponíveis durante A Jornada. Neste quesito, o game brinca com o compasso moral dos jogadores, trazendo urgência e questões de vida ou morte. Roubar pra não passar fome com seu irmão ou se ater a sua honra? Essas são algumas das escolhas de Life is Strange 2.

A Arte dentro da Arte

Sean é um rapaz um tanto quanto artístico e gosta bastante de desenhar. Para não perder essa característica importante que define o personagem, o estúdio implementou um incrível sistema de desenho no jogo, gerando obras de arte fantásticas! Em alguns momentos-chave, o jovem começa a fazer rabiscos no caderno, mas, se o jogador decidir contemplar a ação por alguns minutos, Sean transforma os rabiscos em desenhos memoráveis que dariam um excelente wallpapper.

Além dos desenhos, os garotos podem colecionar souvernis da viagem que acabam funcionando como itens colecionáveis do game. Os caçadores de troféus e conquistas devem se atentar a esses colecionáveis, já que eles são obrigatórios para fazer 100% do jogo.

Vale a Pena?

Com um storytelling impecável, personagens bem construídos, uma engine nova e críticas necessárias, o primeiro episódio de Life is Strange 2 transcende o conceito de jogo e se aproxima do status de obra de arte. Recheado de momentos tristes e alegres, o jogo tem tudo pra ser uma das experiências mais marcantes do ano! Agora é torcer para que o episódio 2 não demore muito pra ser lançado.

A análise do jogo foi feita com um código do jogo para Playstation 4 cedido pela Square Enix.

Pedro Cardoso

Editor do Capacitor, apaixonado por games, filmes e literatura sci-fi/fantástica.

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