Crítica | I Am Not Okay With This – 1ª Temporada (Netflix)

De um ponto de vista rápido e unicamente estético, I Am Not Okay With This está mais inclinada à semelhanças das obras do autor John Green, muito embora esteja bem mais perto de filmes como Carrie, A Estranha e séries como Stranger Things.

Em sete episódios com duração média de vinte minutos, a série original Netflix, baseada nos quadrinhos de mesmo nome de Charles Forsman, trabalha uma comédia dramática sobre as descobertas e amadurecimentos de Sydney (Sophia Lillis, de It, A Coisa,), quem recentemente ficou órfã de pai. Enquanto isso, de forma surpreendente, a trama manuseia um tom sobrenatural cuidadoso e quase didático.

A ambientação tradicional e clássica estadunidense nos faz pensar que estamos vivendo o fim do século XX, apesar de se passar nos dias atuais. Sydney promete ser mais uma protagonista introspectiva, com poucos amigos e um gosto peculiar para tudo. No entanto, é a primeira das inúmeras pequenas surpresas entregues durante o período da maratona (afinal, foi fácil e satisfatório começar e terminar sem quase levantar da cama).

Sydney perdeu o pai, uma de suas maiores referências, há um ano; o mesmo tempo em que está morando na cidade nova. A mudança drástica trouxe de bom a sua amizade com Dina (Sofia Bryant), tão incrível aos olhos de Syd que por vezes ela não acredita serem melhores amigas.

O relacionamento com seu irmão caçula é um dos mais sinceros e reais, de uma sensibilidade pouco vista em outras obras – sempre optam pela dupla de irmãos em constante rivalidade. Por outro lado, após a morte do pai, sua mãe ficou mais fria e distante, criando um buraco entre as duas. É nítido as consequências psicológicas da família, umas mais profundas que outras.

Sinais de depressão são claramente demonstrados pela mãe, da mesma forma que Syd lida com crises de ansiedade e ataques de pânico, tratados na série com uma atenção cuidadosa; às vezes me peguei com mão no peito, conferindo meus próprios batimentos e respiração.

Apesar de poucos e curtos episódios, a série consegue construir personagens, situações e relacionamentos brilhantemente. Vemos o nascer de amizades, o tamborilar delas e as razões para existir. Mas é com Stanley (Wyatt Oleff), o vizinho com interesses românticos, onde assistimos o desenrolar de diversos momentos: o primeiro beijo e a primeira relação sexual, primeiro questionamento sobre a própria sexualidade e os sentimentos.

A personagem principal se destaca, conquistando o telespectador aos poucos. Os produtores não deram tempo de questionar as reações de Syd diante de tantas mudanças, logo entregando uma garota firme que busca entender o mundo ao redor para lidar com as frustrações, medos e incertezas. Novamente, e dessa vez com mais cautela, ao passo que percebemos o nascer de uma possível heroína, a série entrega a naturalidade de um ser humano enfretando problemas mais profundos do que a sociedade procura se preocupar.

Com o roteiro não linear, cenas intercaladas entre presente e futuro garantem a atenção do público, principalmente por sua fotografia referenciar a incrível obra do escritor Stephen King, Carrie, A Estranha. Contudo, se o filme inspirado na obra de King é direto quando se fala do sobrenatural, I Am Not Okay With This procura ser frio e tranquilo, priorizando de forma igualitária contar a história de uma jovem em crescimento tanto quanto tonalizar a trama com cenas sobrenaturais envolvendo habilidades psíquicas e indivíduos misteriosos.

O diretor Jonathan Entwistle (The End of The F***ing World) apostou numa combinação de temática e apresentação diferente da expectativa, sabendo se aproveitar de cada importante segundo para conclusão dessa primeira temporada. Seu olhar introdutório fez toda a diferença, não restando dúvidas de que em breve teremos uma sequência elaborada e dinâmica.

Pedro Cardoso

Editor do Capacitor, apaixonado por games, filmes e literatura sci-fi/fantástica.