Capacitor Entrevista | Luciana Fauber, escritora do livro Erotikós

Recentemente tivemos a oportunidade de conhecer o livro Erotikós, da Luciana Fauber.

De forma sensível e poética, a autora nos apresenta algumas poesias sobre o momento de êxtase – o encontro entre duas almas apaixonadas.

Curiosos sobre os caminhos dessa jovem escritora, tivemos a oportunidade de entrevistá-la.

Confiram abaixo como foi esse encontro.

O Capacitor – Bom, para começarmos que tal falar um pouco de você. Quem é Luciana Fauber?

L.F. – Perguntas sobre mim sempre são as mais difíceis de responder. Nasci em Manaus e aos 11 fui morar em Brasília, cheia de expectativas pelo clima ameno e seco. Desde criança tive um olhar mais sensível para o mundo, fui uma daquelas meninas que chora por tudo, mesmo sem entender os motivos. No ensino médio descobri que meu caminho deveria seguir pela área das Letras, graças aos meus professores de português que tive durante a vida e a minha facilidade para lidar com palavras. Assim, tenho bacharel em Letras Português pela UnB, acredito ter sido a melhor escolha que eu poderia ter feito, tanto pela identificação com o curso quanto pelas portas que Letras me abriu: sinto falta de vários professores, matérias e de amigos que fiz lá. Atualmente trabalho com revisão de texto e como professora de reforço, são coisas que eu gosto bastante de fazer e que estão dentro da minha área. Costumo publicar poesia no instagram há um ano e tem sido uma experiência incrível, principalmente pelas pessoas que eu tenho conhecido por lá.

O Capacitor – Acho que a pergunta que todo mundo tem vontade de fazer a uma escritora é: como surgiu o hábito da escrita? Teve alguma influência?

L.F. – Aprendi a gostar de ler quando era criança, gostava de ir para outros universos e conhecer novos mundos. Com o tempo percebi que podia criar os meus próprios lugares, pensar em futuros ou em passados diferentes, me atraía bastante a ideia de ter controle sobre tudo que acontecia, já que da vida não temos controle algum. Foi então que em 2008 conheci as fanfictions e percebi que era possível usar uma linguagem mais cotidiana, próxima da realidade. Com meus 12 ensaiei escrever uma história em que eu e minhas amigas morávamos juntas e cada uma tinha um curso na faculdade, uma profissão – provavelmente foi aí que começou minha péssima mania de ter histórias inacabadas, me cobram um fim até hoje.

Com poesia já foi um pouco diferente, aprendi a gostar na faculdade quando tive contato com Mia Couto, Alberto Pucheu e também com outros poetas estudados no curso. Aos poucos fui percebendo como era interessante usar as palavras do meu jeito, “calcular” os sentidos e escrever algo que tivesse a minha voz. Foi nesse gênero que me encontrei.

O Capacitor – Como é conciliar o processo de escrita a outras áreas de sua vida, como o trabalho, a vida pessoal, o tempo com os amigos?

L.F. – Grande parte dos meus livros eu escrevi pelo celular. Foi a maneira mais prática que achei de ter sempre uma folha em branco para criar, sem precisar levar um caderno, por exemplo. Submergir, meu primeiro livro, foi criado todo assim, com poemas escritos no metrô, no ônibus, na fila do restaurante universitário, nos corredores da universidade, situações cotidianas que viraram poesia, memória. Então de certa forma é tranquilo conciliar a escrita, por mais que às vezes o estresse com o trabalho seja grande, sempre sobra um tempinho para rascunhar alguma coisa no celular e os meus amigos sempre me apoiam, tenho muitos poemas sobre momentos que passamos junto, memórias preciosas que quis eternizar com a literatura. É como se a poesia fosse uma parte de mim, a mais importante, que convive com todo o resto.

O Capacitor – Como foi a recepção de sua família quando você revelou que estava escrevendo um livro?

L.F. – Talvez não tenha tido um momento “Família, estou escrevendo um livro!”, porque eu não os escrevi com essa noção de que eu estava sim escrevendo um livro a cada poema publicado on-line, principalmente porque eu não tinha em mente um final ou um planejamento linear. Acho que descobriram quando participei de um concurso de poesia lá da faculdade e eu precisava de curtidas no facebook. Meus familiares reagiram muito bem, me apoiam bastante, seja comprando os e-books, indo em lançamento de livro ou divulgando para os amigos, é realmente muito bom vê-los comigo me incentivando dia após dia. Até mesmo meus tios e primos que moram longe me dão esse apoio. De certa forma, acredito eu, já esperavam que eu me tornasse escritora, porque meu pai também escreve e eu já revisava alguns livros dele durante a graduação… talvez seja um pouco daquilo de “filho de peixe, peixinho é” (nós dois somos do signo de peixes, então acho essa piadinha interna super divertida)

O Capacitor – Quais são as principais dificuldades que você encontra enquanto escritora?

L.F. – É muito difícil lidar com bloqueios literários. Às vezes passo semanas sem conseguir escrever algo que realmente me agrade, sabe? Tem toda uma questão do estresse também, da correria da vida que faz a gente esquecer de ver a poesia num pôr do sol ou em uma flor, ultimamente tem sido difícil lidar com isso. Talvez também tenha uma pressão de mim mesma para produzir poemas que não sejam “todos iguais”, tento sempre ir além dos meus limites. No instagram eu costumava fazer um desafio de 365 dias de poesia, mas em certo ponto falhei porque não conseguia mais escrever sem encarar como uma “obrigação” e isso pra mim tira todo o prazer do ato de escrever. Por esse motivo tento diminuir essa pressão, acredito que assim os poemas se tornem até mesmo mais sinceros e possam de algum jeito alcançar as pessoas com o sentir, a identificação.

Uma coisa que me incomoda é que ainda há uma resistência com a literatura erótica. Não são poucos os grupos de escritores do facebook nos quais a divulgação de obras eróticas são proibidas ou vistas com maus olhos, com certa implicância ou rixa, coisa que ocorre também com outros gêneros, algo que acredito ser bem desnecessário, mas ainda tenho esperança de que pouco a pouco os escritores se unam mais. Ainda não consegui montar um grupo de leitores de poesia, o trabalho de divulgação e de criação é bem desgastante ao mesmo tempo que necessário, tenho mantido um instagram onde publico poesia e tenho um alcance melhor. Mas acima de tudo, fico feliz pela poesia ser um gênero que tem se popularizado, com uma receptividade cada vez maior e é muito legal ver como os “poetas de instagram” têm aumentado: é muito bom prestigiar o trabalho de outros poetas.

O Capacitor – Infelizmente, no Brasil, ainda existe muita resistência acerca da leitura, em especial, em relação ao acesso aos livros pelos mais jovens. Como você enxerga isso? Tem interferência em seu trabalho?

L.F. – Acredito que interfere um pouco, principalmente por ouvir dos mais jovens coisas como “poesia é chata, não faz sentido”, talvez por conta de como o gênero é apresentado na escola, com aquela pressão de ser cobrado em prova e visto como um objeto de estudo, não de necessariamente prática. Por bastante tempo pensei assim, em uma poesia inalcançável, “chata” e sem sentido. Se alguém tivesse me apresentado mais cedo a poesia como ela é, como um meio de dar voz a mim mesma e ao que sinto, vejo e lembro, talvez essa minha descoberta como escritora e poeta não ocorresse apenas na graduação de Letras. Fico pensando em quantos poetas estão perdidos por aí, sem saber que podem se encontrar na escrita, seja na poesia ou em outros gêneros. É um dos motivos de eu ter feito meu estilo literário de uma forma mais livre, desapegada da métrica “antiga” e priorizando o falar e o sentir.

E a mesma coisa acontece com outros gêneros, com o livro em si sendo visto como algo chato cobrado em prova e às vezes visto até como perda de tempo por conta da quantidade enorme de entretenimento disponível hoje. Acho que a popularização de plataformas como Wattpad, Sweek e Amazon podem aproximar os jovens dos livros, de um jeito a acabar com esse preconceito de que livros são chatos: talvez eles só não tenham achado um gênero (ficção, romance, fantasia e afins) que os tenha cativado.

O Capacitor – Antes da publicação do Erotikós, você tem outros livros escritos. Que tal falar um pouco sobre eles e dizer onde podemos encontrá-los?

L.F. – Submergir é o meu primeiro livro. Ele foi escrito durante os últimos semestres da faculdade, no ônibus, no metrô, quando meu olhar sobre o mundo expandia-se e tornava-se mais atento às “surpresas diárias” que nos cercam. Tenho um carinho muito grande por ele porque marcou meus primeiros passos, muitas vezes incertos ou turbulentos. Foi publicado no Wattpad e resolvi deixá-lo na plataforma pelo apego sentimental, pela sensação de descoberta que ele me propiciou.

Na sequência veio Emergir. Enquanto o primeiro é um mergulho dentro de si, Emergir possui uma visão para o fora, para aquilo que vemos todos os dias mas não damos atenção: a criança deixada na rua, a maldade do mundo, sentimentos conflitantes que gerariam uma correnteza, uma explosão do eu. Foi um livro que surgiu quando minha visão se abriu acerca dos problemas que enfrentamos diariamente na sociedade, questões que muitas vezes ignoramos ou escolhemos não nos importar. Assim, encontrei nele um jeito de não me sufocar com as manchetes sobre barbaridades, por isso há uma voz muito crítica nesse livro. Está disponível como e-book na Amazon.

Solitudes é um dos meus favoritos. A ideia surgiu para um concurso e depois do resultado negativo resolvi postá-lo na Amazon, fiquei bem feliz com o feedback. Esse é um livro sobre a solidão que nos afeta, mas sob diferentes perspectivas, na verdade três: um jovem ansioso, uma jovem surda e um idoso cego. Somos levados aos poucos a conhecer três personagens, três eu-líricos cujo sentimento de solidão é a única coisa em comum entre eles: um sentimento que une o sentir humano em algum momento da vida. Com desfechos diferentes, esses três personagens nos trazem ensinamentos sobre o viver na nossa sociedade atualmente. Foi um trabalho penoso e gratificante, pensar em como usar a linguagem do “dizer e não dizer”, fazer o leitor trabalhar para identificar as vozes, os contextos apresentados em verso e levando em consideração as peculiaridades de cada personagem.

Quando o cometa passar foi um conto de natal que fiz em um grupo de escrita, trazendo aquela atmosfera de natal onde milagres podem acontecer. Nesse livro encontramos Victoria, uma jovem que faz aniversário nessa época e encontra-se dominada pela culpa e pela saudade, mas o Universo dá a ela uma chance de se libertar e seguir em frente. Quis trabalhar justamente o sentimento de perda e de culpa, a saudade e como podemos de algum jeito aliviar o peso no coração por causa de algum acontecimento que foge do nosso controle. Pretendo futuramente fazer dele um livro maior, aprofundar personagens, dar mais contexto. Também é um e-book disponível na Amazon.

O Capacitor – Erotikós, seu livro mais recente, é de poesia. Em que momento você se descobriu poeta?

L.F. – Comecei a escrever poesia depois de passar por momentos conturbados na vida aos 19, foi um jeito meu de brincar com as palavras e de colocar meus sentimentos no papel, sem pensar muito no que poderia dar. Lembro da expectativa, das mãos geladas enquanto eu ensaiava escrevê-los no papel. Com certeza meus professores, tanto da escola quanto da faculdade influenciaram na minha descoberta como poeta, tenho aulas incríveis guardadas nas minhas memórias. Alguns meses depois de eu ter ensaiado meus três primeiros poemas (estão bem guardadinhos) sobre uma rosa, um pássaro e a saudade, encontrei um grupo de escritores que publicavam no Wattpad. Foi então que vendo que haviam outros poetas no grupo, resolvi me aventurar pela escrita, seguindo um estilo literário que mistura fluxo de pensamentos com descrições do cotidiano, resultando em Submergir. Uma coisa que eu gosto muito sobre poesia é poder lembrar do momento de criação de cada poema, saber quais pensamentos, quais imagens me vieram à cabeça e resultaram naqueles versos, o que de certa forma os transforma em “meus” de um jeito muito sublime: meus poemas são as coisas mais preciosas que posso ter e deixar pra trás nessa vida pelo significado que cada um carrega.

O Capacitor – Fale um pouco sobre o Erotikós, de onde surgiu a ideia para escrevê-lo?

L.F. – Erotikós surgiu no final de 2017, depois de escrever dois livros de poesia na plataforma Wattpad e sentir que eu precisava me refazer, dar um passo além e sair da minha zona de conforto. Pensei: preciso escrever poesia sobre um assunto totalmente contrário ao que fiz até agora. Foi então que lendo alguns livros de poesia erótica na plataforma e lendo “O amor natural” do Drummond que pensei em arriscar. Na época eu gostei muito da ideia do “dizer e não dizer”, de brincar com a imaginação e com o falar pouco, mas sentir demais, fugindo totalmente do vulgar e do explícito. Precisava de um título que surgiu quando pesquisei erótico no dicionário (eu gosto muito de pesquisar o significado das palavras, sempre me dá ideias para poemas) e surgiu a palavra grega “Erotikós”. Então eu tinha o título e a ideia. Mas eu não tinha coragem de colocar o meu nome, sabe? Fiquei pensando que poderia chocar os conhecidos com a literatura erótica e não conseguia usar a minha voz poética da época para isso. Por isso criei um pseudônimo, Heitor, com gostos, personalidade, dono de uma escrita que era diferente da minha. Apropriei-me então da voz dele, criando personagens, planos de fundo ou então o puro sentimento de amar e de ser amado, criando assim cada poema que de certa forma ainda se misturava ao meu estilo descritivo do cotidiano, surgindo assim Erotikós. A recepção foi muito boa na plataforma, tive leitores fiéis e ganhei uns três concursos promovidos por outros usuários.

Em julho de 2018 tirei o livro do Wattpad e publiquei na Amazon, conheci parceiras incríveis do instagram que têm blogs literários e fazem resenhas. Elas me ajudaram demais a divulgar o livro, até que um ano depois a versão física surgiu com a Editora Vecchio. É bem incrível pensar em como as coisas caminharam para chegar aqui, só aumenta a vontade de escrever mais livros e mostrar para as pessoas.

O Capacitor – Você tem novos projetos em vista? Pode antecipar alguma coisa para a gente?

L.F. – Tenho! Gostaria de tentar romances, tenho muitos rascunhos guardados, sinto que talvez eu ainda não tenha encontrado a “minha voz” em prosa, ainda estou testando o que poderia melhor se encaixar comigo, com o meu estilo. Tenho rascunhos sobre feminismo, bullying e histórias românticas, temas que possuem ligação comigo e são o que eu gostaria de escrever.

Um que já tenho o esboço pronto fala justamente sobre o bullying e como pode ser algo cruel que convive conosco durante boa parte da infância e adolescência. É um projeto delicado que exige demais de mim, mas quero escrevê-lo e homenagear uma pessoa que não está mais neste mundo. Vai ser um projeto bem importante e precioso pra mim, espero que consiga colocar em palavras tudo que desejo dizer com ele.

Acredito que em 2020 já terei mais livros publicados, esse é só um dos tantos engavetados, estou pensando em publicá-los na Amazon e talvez no Wattpad, quero arriscar também prosa poética, assim como ensaiei em Solitudes. Estou bem empolgada com os projetos, vem muita coisa boa por aí!

O Capacitor – Ainda sobre o campo da publicação, um dos principais debates da atualidade é acerca da expansão dos e-books. Como você vê essa nova tendência da atualidade? As tecnologias têm sido facilitadoras no processo de criação e divulgação da escrita?

L.F. – Acredito que os e-books sejam um meio de dar acessibilidade aos livros, é uma chance tanto para os escritores quanto para os leitores. A criação de plataformas de autopublicação também são um estímulo contra a pirataria de PDFs, uma vez que em algum momento surgem promoções de livros legais e gratuitos, sendo assim uma forma de apoio ao escritor: a leitura, a avaliação, até mesmo a indicação da obra para amigos e conhecidos. A proximidade criada entre esses dois agentes literários, quem escreve e quem lê, é algo que só a tecnologia nos propicia, são novos horizontes que a cada dia mostram-se mais amplos.

Por meio da autopublicação na Amazon, por exemplo, e o marketing digital hoje é possível que “desconhecidos” publiquem seus livros e consigam chamar a atenção de uma editora para uma publicação física. É trabalhoso e penoso, mas em algum momento o reconhecimento vem.

O Capacitor – Por fim, gostaríamos de saber o que você poderia dizer para a galera que está começando agora e tem o sonho de escrever seu próprio livro.

L.F. – Ah, leia e escreva! Acredito que a leitura ajuda bastante na hora de escrever, a memorizar construções de autores que você admira e a encontrar a sua voz, o gênero que você mais se identifica. Tenho uma amiga escritora que sempre me diz: é melhor ter páginas e páginas de rascunhos para consertar depois do que páginas em branco. Para poesia tem um livro que eu gosto bastante, se chama “Cartas a um jovem poeta” e acho que os ensinamentos ali são muito relevantes para o fazer poético, é muito sobre escrever aquilo que ninguém tende a reparar, numa caminhada de autodescoberta e sempre testando os próprios limites. Vão ter momentos em que o desistir parece ser o caminho mais fácil, correto, mas nesses momentos precisamos buscar apoio nos amigos, inclusive nos de escrita e continuar tentando porque uma hora vamos acertar.

O Capacitor – Agradecemos pela atenção e pela disponibilidade. Deixamos aqui esse espaço em aberto caso você queira acrescentar algo mais.

L.F. – Queria agradecer demais ao blog pela oportunidade, principalmente ao Vanderson por ter sido sempre muito solícito e paciente comigo, senti-me muito honrada quando o convite foi feito. Deixo também meus agradecimentos à Editora Vecchio, porque sem ela Erotikós ainda seria um e-book na Amazon, perdido por ali. Ah, uma coisa importante: a editora está fazendo aniversário esse mês e até o dia 30 tem promoção dos livros (inclusive de Erotikós) e de publicação. Mais uma vez, obrigada pelo espaço!

Pedro Cardoso

Editor do Capacitor, apaixonado por games, filmes e literatura sci-fi/fantástica.

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