Crítica | Inacreditável – 1ª Temporada (Netflix)

Apesar de ter sido lançada em setembro desse ano, Inacreditável é uma série Netflix importante para a bagagem do telespectador, por isso merece ser indicada a qualquer momento. Principalmente se você estiver procurando sensibilidade e um lado humano cuidadosamente retratado.

A minissérie é baseada no livro “Falsa Acusação: Uma História Verdadeira” dos jornalistas T. Christian Miller e Ken Armstrong. Adaptada para melhor, Inacreditável é uma trama que acontece em duas linhas do tempo, começando em 2008, com o “suposto” estupro de Marie Adler e, três anos depois, duas detetives investigam uma série de abusos sexuais ocorrendo nos Estados Unidos.

Marie Adler (Kaytlin Dever) teve seu apartamento invadido durante à noite e foi estuprada por um homem encapuzado. Na manhã seguinte, física e psicologicamente abalada, Marie é forçada a dar o mesmo depoimento várias vezes, até que suas palavras passam a ser desacreditadas pelos detetives cuidando do caso. Os dois homens começam a duvidar da adolescente depois de sua ex mãe adotiva descrevê-la como uma garota que sempre quis chamar atenção, fazendo também o telespectador duvidar do crime.

A série surpreende desde seu primeiro episódio – são oito no total -, com atuações intimistas e sensíveis sobre um assunto recorrente na sociedade atual. Não somente o crime, mas a pressão sobre a vítima, quase exigindo dela justificação para o que lhe ocorreu. O próprio estuprador, um homem de ações subjetivas, chega a falar para que, a partir daquela noite, Marie passe a trancar portas e janelas; a colocando em posição de culpa. O telespectador acompanha o caso da garota transformá-la em culpada, posteriormente sua vida virar de cabeça para baixo. O transtorno seguinte é notoriamente bem apresentado por Dever, cujas expressões aproximam para os sentimentos escondidos abaixo da pele.

As duas histórias transitam entre os episódios, finalmente se encontrando no final. Em 2011, a detetive Karen Duvall (Merritt Wever, The Walking Dead) fica encarregada do caso de Amber, mais uma jovem estuprada dentro da própria casa. Com parte do roteiro dependendo de sua interpretação para bom desempenho, Wever não decepciona. Duvall é emocional e sensível, mas também pulso firme e persistente. Sua postura diante das vítimas, permitindo que elas sintam e expressem como se sentirem à vontade, equilibra a parte masculinizada da sociedade que tenta a todo instante diminuir suas dores ou desconfiar de suas histórias.

Certa de que os estupros ocorridos em várias cidades do país estão interligados, Duvall acaba procurando a detetive Grace Rasmussen (Toni Collete, O Sexto Sentido), sugerindo juntarem os casos e encontrarem, finalmente, o criminoso. Rasmussen é sarcástica e racional, tão persistente quanto; cria um paralelo de sustentação, tornando o conhecimento e influência individual das duas em ferramentas necessárias para o prosseguimento do caso.

É uma obra baseada em fatos reais que inspira, dá visibilidade e voz para tantos casos ao redor do globo. No primeiro arco, é possível perceber como as pessoas (principalmente homens) estavam indispostas a acreditar na garota, estando mais inclinadas a julgar, tirar apoio e criminalizar a vítima. Como, mesmo depois de todo sofrimento, as mulheres são obrigadas a reviver o momento e, também, ter sua postura diante do abuso criticada se estiver fora do que esperam – choro e reclusão.

Ao mesmo tempo, duas mulheres com diferentes personalidades, dando espaço para que as vítimas sejam vítimas e procurando abrir espaço para que os crimes sejam visto como o que são dentro do âmbito de trabalho majoritariamente masculino. As declaradas atuações têm papel importante para trazer a emoção e a necessidade, o sensível e o humano, aquele toque na mente que busca o telespectador para dentro da trama e o faz repensar.

A grande pergunta final não é sobre “por que ele fez isso?”, mas sim o por que ele escolheu cada uma delas. Tão diferentes e tão distantes, ainda assim estiveram sob sua mira, unicamente por serem mulheres. Inacreditável não é Marie Adler ir à polícia dar queixa de um crime; Inacreditável é a sociedade desacreditar antes mesmo de ouvir.

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