Resenha | Mistborn: O Império Final – Brandon Sanderson
“Viva da melhor maneira possível enquanto o sol vermelho está sobre você, porque à noite, as brumas podem te levar.”
Mistborn faz parte da primeira série de fantasia escrita pelo autor americano Brandon Sanderson. Consiste em O Império Final, O Poço da Ascenção e O Herói das Eras, todos publicados no Brasil pela editora LeYa.
Há mil anos um herói falhou em defender a Terra da escuridão e, como consequência, o mundo agora vive castigado por um céu avermelhado, flores sem cor, chuvas de cinzas iminentes e brumas noturnas mortais. As terras conhecidas como O Império Final são governadas pelo Senhor Soberano, um imperador intocável, poderoso e, aparentemente, imortal.
Nessa sociedade, as pessoas são divididas entre nobres e skaa – sendo esses escravos usados pelos nobres e o próprio Senhor Soberano. Entre eles, existem os alomânticos, pessoas com poder de manipular um dos metais e seu respectivo par. Aqueles com o dom de manipular todos os metais são os Nascidos da Bruma; normalmente nobres, mas, alguns filhos mestiços de nobre e skaa podem ter a chance.
É o caso de Kell (Kelsier) e Vin. O primeiro, é o ex-líder de uma gangue de ladrões que, vendo o fracasso de outros em derrubar o Senhor Soberano e seu império ditador, arriscou a própria vida numa investida. Como todos, fracassou, e a punição foi ser enviado para as Minas de Hathshin, conhecidas por ser a prisão e, também, o cemitério de todos que entram. Mas Kell conseguiu fugir, gerando uma onda de esperança para os skaa e outra de preocupação para a nobreza. Foi lá que seus poderes de Nascido da Bruma despertaram e, com isso, a certeza de que podia matar o Senhor Soberano usando um elemento proibido.
Vin, abandonada pelo irmão em uma gangue de ladrões de Luthadel (capital), sofre ataques físicos e psicológicos pelo líder, obrigada a trabalhar para ele em troca de um mísero teto e, às vezes, comida. Ela não sabe que é uma Nascida da Bruma até que Kelsier a vê usando seus poderes. Sabendo do perigo que a jovem corre estando na mira dos Inquisidores, o líder a recruta para sua própria gangue (constituída pelos sobreviventes da última tentativa) e a convence a lutar em prol da queda do imperador.
Depois de tantas fantasias “mais do mesmo”, Sanderson nos convence a ler com toda cautela e atenção para que nenhum detalhe se perca no meio. Os personagens tem passado, o que torna fácil nos apegar a eles, seja para gostar ou odiar; possuem personalidades distintas, modo de falar ou agir, ajudando no reconhecimento antes mesmo do nome ser citado. A magia imposta no livro é algo criativo, partindo da premissa que cada metal é uma habilidade – força, rapidez, etc. Embora alguns dos poderes não sejam tão profundamente trabalhados, temos noção da eficácia.
Kelsier tornou-se lenda ao ser o único sobrevivente das Minas, alguém cuja esperança as pessoas depositam. De dia, os skaa trabalham como escravos, à noite, eles se escondem nas casas, fugindo das perigosas brumas. Uma pessoa comum ao entrar em contato, dizem que nunca mais retorna. Apenas um Nascido da Bruma pode caminhar entre elas e sobreviver. Por isso, a fama de Kell como qualificado para enfrentar o ditador é tão grande.
O grande vilão dessa história é o Senhor Soberano. É citado a maior parte do livro, realçando sua imponência e imortalidade. Alimenta nosso medo até o momento de sermos realmente apresentados a figura e, mantendo o nível, Sanderson criou um personagem que faz jus a sua fama. Sem os meses recrutando um exército, treinando homens, recolhendo informações e montando um plano para derrubar o imperador, Kell e sua gangue jamais teriam chance de enfrentá-lo.
As cenas de ação são de encher os olhos. Dá para imaginar os movimentos, os detalhes, mergulhar nas sensações propostas, como o medo, o suspense, a adrenalina e a ansiedade. Por ser metal, a moeda é um dos principais elementos usados nos embates, usadas para atacar, para empurrar e puxar (termos usados pelo autor). No entanto, de uma fechadura a um bastão, qualquer coisa de metal é uma possível arma. As lutas são, assim, um poço de surpresas.
Com uma premissa tão complexa, é agradável acompanhar a história por tanto tempo. O livro decorre durante meses, onde vamos nos aperfeiçoando aos personagens, desde os principais aos secundários, como Ham, Dockson, Brisa, todos companheiros de Kell, e também Elend Venture, a quem conhecemos por meio da visão de Vin.
Temos criaturas não-humanas existindo entre eles, pouco aprofundadas, mas talvez sejam exploradas na continuação; os próprios Inquisidores, dos quais Vin foi salva inicialmente, são homens com pregos imensos nos olhos e tatuagens enormes.
Esse livro é uma obra genial em todos os quesitos, mas fica ainda mais interessante quando críticas sociais reais são incrementadas de maneira sutil: religiosa (não existe outro Deus exceto o Senhor Soberano; as outras religiões foram altamente proibidas para que existisse somente ele como divindade), governamental (a ditadura ameaçadora), ambiental (todo o universo sem cor, poluído e adoecido).
O único ponto negativo é explicar os mistérios sempre rápido demais. Nossa maior preocupação é, de fato, o esperado encontro do exército de Kell contra o exército do Senhor Soberano.
Mistborn – Nascidos da Bruma: O Império Final é uma obra para quem gosta de fantasia complexa, história, pitadas de humor, ação e referências reais. Cada uma das páginas merece estar ali; cada cena carrega um fio importante para que no fim a teia se desenrole. Quanto ao final, o livro nos dá uma conclusão não só plausível, como surpreendente – para os personagens e para o leitor. Ficará uma pequena pulga atrás da orelha para saber o destino dos sobreviventes, mas ler O Poço da Ascenção (continuação) é completamente opcional.