A claustrofobia é um medo irracional de permanecer em ambientes fechados e apertados, podendo ocasionar crise de pânico em pessoas que sofrem deste problema. Ambientes como elevadores, metrôs e tubos de ressonância magnética costumam ser as maiores causas para um surto. Esta é uma condição comum. No entanto, em Encarcerados, livro escrito por John Scalzi (Guerra do Velho) e publicado pela Editora Aleph, somos apresentados a um novo tipo de encarceramento que deve deixar até mesmo os ‘não-claustrofóbicos’ com um frio na espinha.
Ambientada alguns anos no futuro, a história nos mostra uma sociedade que fora acometida por uma misteriosa doença que ficou conhecida como Síndrome de Haden. Nos estágios mais avançados, a doença pode privar as pessoas de todo e qualquer movimento de seu corpo, deixando-as encarceradas em suas mentes.
Por ter atingido uma grande parcela da população mundia, a sociedade se desenvolveu de modo a incluir as vítimas da doença, utilizando de uma avançada tecnologia que permite transportar a consciência dos enfermos para androides, chamados C3 (referência a C-3PO), permitindo que estes possam conviver com a sociedade de maneira normal.
Além dos encarcerados, existem os integradores, pessoas que não chegaram ao estágio final da doença e podem, através de um mecanismo instalado no cérebro, receber consciência de vítimas de encarceramento, para que possam experimentar um mundo através de seus corpos.
Um ‘Whodunit’ diferente
O livro acompanha o agente Chris Shane, filho do político bilionário Marcus Shane e vítima da síndrome de Haden desde pequeno. Por conta da fama de seu pai, Shane, durante muito tempo, foi um símbolo na luta pelos direitos dos Hadens. Contudo, após chegar à vida adulta, ele decide se afastar dos holofotes e lutar pelo seu próprio espaço na sociedade.
Ao ser contratado para a divisão de crimes envolvendo Hadens do FBI, Chris precisará investigar um crime que é muito mais complexo do que aparenta. A partir daí, a história torna-se um intrigante suspense, no estilo ‘Whodunit’ (ou “Quem matou?”). No entanto, este não é um suspense qualquer, já que o livro nos introduz a um contexto incrivelmente inovador, ainda que guarde algumas tristes semelhanças com a nossa sociedade.
Ambientação
Um dos elementos mais marcantes em Encarcerados é o contexto criado para a sociedade. É muito interessante acompanhar todo o debate em relação aos Hadens, os gastos do governo para auxiliá-los e como a tecnologia evoluiu para conceber a estes uma vida “normal”.
Leva um tempo para entendermos como funciona este universo. Ao longo da narrativa vamos entendendo como funcionam os C3, os integradores e mais detalhes da síndrome de Haden e assim, a cada capítulo vamos nos aprofundando à realidade dos personagens.
Há quem possa arguir que o livro trata-se de uma distopia. No entanto, observar como a sociedade se desenvolveu, de maneira unida, para combater este mal, nos mostra como o cenário também traz nuances de uma utopia.
Como já era de se esperar, nada é tão simples nem tão unidimensional. Existe preconceito e uma clara diferença nas condições em que pessoas de classes diferentes vivem. Tudo isso é abordado no livro de maneira profunda e interessante, sempre nos levando a questionar a nossa própria sociedade.
Storytelling
Outro ponto extremamente positivo do livro é a narrativa de Scalzi. Escrito de maneira dinâmica, beirando a casualidade, o livro possui uma leitura extremamente fluida e prazerosa. Com toques de humor e ganchos bem trabalhados, Encarcerados é daqueles livros que são lidos de maneira rápida e voraz.
O ponto fraco fica para a solução do mistério, que acontece de forma rápida e casual sem que seja dada a devida importância. A coisa é entregue mais como uma constatação que vai se confirmando ao longo da trama do que uma revelação. Apesar de funcionar para a narrativa como um todo, o desfecho torna-se um tanto anti-climático.