Crítica | Os 13 Porquês – 3ª Temporada (Neflix)
Poucos foram os eventos importantes da trágica e desnecessária segunda temporada que desencadearam a terceira da polêmica série 13 Reasons Why. Por ser inspirada no livro único de Jay Asher, a sequência da série vem sendo criticada pelos próprios fãs. O segundo ano foi um amontoado de erros e furos.
A terceira temporada continua sendo um arco desnecessário, mas cumpre com seu papel em corrigir alguns erros – deixando outros para a quarta e última, já prometida pela Netflix. A trama desse ano se firma sobre o assassinato de Bryce Walker e o mistério acerca de quem o matou. Bryce não só estuprou Hannah Baker, mas outras sete meninas, inclusive Jessica Davis.
Anteriormente éramos apresentados a quase inexistência de uma redenção para o rapaz, embora tenhamos visto ele ser inocentado diante das acusações. Isso implicou profundamente no ódio e revolta de Clay, interpretado pelo imutável Dylan Minnette. Sua expressão é a mesma do início ao fim, confundindo tristeza com a incapacidade de trazer à tona verdadeiras emoções.
Com a notícia da morte de Bryce, todos tornam-se suspeitos. Clay, pouco comovido e quase agradecido, ganha os holofotes da polícia. Sua opinião acerca do falecido não muda, frequentemente o trata como algo abaixo de um ser humano; ou seja, indigno de esperança ou redenção.
Por falar em redenção, a nova temporada busca mostrar, através de passado e presente, Walker lidando com a consciência do que fez a tantas meninas. A ficha finalmente cai, se reconhece como o criminoso que é e, em diferentes cenários, tentam mostrar outro lado seu, algo autoexplicativo para tantas de suas ações. Acontece também com um de seus amigos próximos, Monty, quem violentou Tyler na última temporada. Ambos cometeram crimes horrendos, é um fato. Mas o contexto apela em procurar motivos para explicar suas personalidades, como o fato de Monty ser abusado pelo pai dentro de casa.
Cada sub conflito molda-se em cima dos traumas vividos por cada personagem. A fotografia da série busca diferenciar as passagens de tempo, usando tons quentes para o passado, e frios para o presente e futuro – esse, narrado pela nova personagem, Ani, cujo papel parece se explicar durante o último episódio. É indiscutível como cada um tem sua história bem formulada, vidas que se ligam na rede de omissões. Por outro lado, apenas alguns passam verdadeira emoção em seus papéis, mesmo sendo apresentados pontos sobre abuso sexual, relacionamentos familiares e amorosos, aborto, problemas com drogas e outros.
Clay passou por duas temporadas sendo protegido pelo luto e pelo amor não correspondido, mas nesse momento nem mesmo o roteiro conseguiu livrá-lo do que realmente é: um garoto vulnerável acometido interiormente pelos eventos ao seu redor. Aos poucos os próprios amigos percebem como Clay tem a capacidade de argumentar por tempo suficiente para convencê-los de que sua verdade é a única plausível. Tentar entender o próximo tornou-se um complexo, o deixando cego para como suas decisões pressionam aqueles ao seu redor. Embora uma de suas grandes escolhas, no fim, tenha sido o melhor, Clay não é um exemplo a se seguir. É um jovem com complexo de heroísmo, acredita verdadeiramente ser capaz de ajudar todos, mesmo aqueles que precisam de ajuda profissional.
Para equilibrar o clichê do mistério e o fraco suspense, poucos personagens conseguem trazer emoção à trama com o misto de vivências, traumas e novas decisões. Mas a personagem de Alisha Boe é um arco de superação e empoderamento, mostrando uma nova perspectiva de quem precisa lidar com o trauma de ter sido estuprada. Em decorrência disso, a partir de vontades próprias e conselhos externos, Jessica se autodescobre sexualmente, passando também a descobrir suas verdadeiras vontades e desejos. Sua posição firme é o pontapé para a iniciação de um grupo de garotas que passaram pelo mesmo, procurando desmistificar o heroísmo dos jogadores do time da escola, buscando destaque para as minorias e procurando defesas para os oprimidos.
O arco de Tyler nesse ano também ganha destaque para emoção e profundidade. Depois de Clay o impedir de entrar armado durante o baile da escola, o garoto fica sob vigilância do grupo, aos poucos tentando comprovar de que mudou, que a ajuda recebida foi necessária para fazê-lo repensar. Tyler, interpretado pelo sensível Devin Druid, é a expressão de como traumas afetam profundamente o psicológico das pessoas, influenciando em decisões drásticas e possivelmente fatais. Ele é, também, a expressão de amadurecimento, força e superação.
A série corrige alguns erros do passado, mas comete outros tão horrendos quanto. Esse ano procuraram focalizar na justiça, tocando na ferida de que todo tipo de crime, do sutil ao mais avassalador, deve ser julgado corretamente. Enquanto Clay reafirmava seu desprezo e ódio por Bryce a ponto de ficar quase feliz por sua morte, outros procuram destacar sorrateiramente as questões dos direitos humanos, sobre como ninguém deve deter do poder em decidir quem vive e quem morre, quem pode ser capaz de mudar ou continuar praticando o mal.
Contudo, ao final, quando o mistério é revelado para o telespectador – e falha em chocar – todo esse conceito e posição se perde, quebra-se em contradições criminosas. Aqui, a trama influencia diretamente as pessoas sobre o que é certo e o que é errado, como devemos agir quando um crime é cometido por alguém que amamos. Devemos protege-lo a todo custo, mesmo que isso implique colocar a culpa sobre outra pessoa? Claramente Os 13 Porquês devia ter sido interrompida em sua primeira temporada, impedindo assim que transmitisse interpretações com duplo ou mais sentidos para o público, em sua maioria, jovens em formação.