Crítica | Coringa (Sem Spoilers)

“Sou um palhaço. Rir é minha sina.” (Drearylands – The Greatest Show on Earth)

Existe uma conversa constante de que os filmes baseado em quadrinhos atingiram um ponto de saturação onde tudo já foi feito e agora só vemos repetições e o desgaste fica cada vez mais evidente.

Por mais que tenhamos excelentes filmes de heróis, é notório que há uma larga oferta do gênero, assim como uma demanda. No entanto, filmes como Coringa, nos mostram que ainda há muito espaço para explorar e que o nível pode ser ainda mais alto.

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Put on a Happy Face

Estrelado por Joaquin Phoenix (Her) e dirigido por Todd Phillips (Se Beber Não Case, Cães de Guerra), Coringa se passa entre o final da década de 70 e início da de 80 e conta a história de Arthur Fleck, palhaço que viria a se tornar o mais icônico vilão dos quadrinhos.

Sem vínculo com nenhum universo compartilhado, o filme abre mão de amarras para contar uma história inteiramente nova e com um estilo próprio. Por conta disso, Coringa se destaca de todo e qualquer filme de heróis já feito até aqui, estando muito mais próximo de filmes como Taxi Driver e Laranja Mecânica do que de um Liga da Justiça.

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Arthur Fleck x Travis Bickle

A menção a Taxi Driver não é aleatória. O filme guarda grandes semelhanças com o longa dirigido por Martin Scorsese, que também produz Coringa. Assim como Travis Bickle, interpretado por Robert De Niro (que também está em Coringa), Arthur Fleck é alguém incompreendido e “escorado” da sociedade e que almeja, acima de tudo, ser notado pelas pessoas.

Em diversos momentos é possível traçar paralelos entre ambos os personagens assim como notar as inspirações que Phillips teve no longa, que também se passa em um período semelhante.

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Indo além dos quadrinhos

Além de todas as referências ao Universo DC que poderia se esperar em um filme de quadrinhos, o longa também aproveita a oportunidade para referencias clássicos do cinema, seja de forma óbvia ou de forma discreta. Uma das mais obscuras é a referência à canção “Put on a Happy Face” cantada por Dick Van Dyke e Janet Leigh em Bye Bye Birdie. É

O filme se destaca dos demais do gênero ao tentar se posicionar entre os grandes clássicos do cinema usando de momentos mais “artísticos” e contemplativos em vez de se apoiar em alívios cômicos e momentos marcantes de ação. Este é um filme que se apoia em roteiro e atuações.

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Um novo lado do vilão

Sem dúvidas, o ponto alto do longa é a atuação entregue por Joaquin Phoenix como Arthur Fleck / Coringa . O ator trouxe vida ao personagem de maneira brilhante. Com sua própria interpretação, sem repetir o que foi feito por Heath Ledger e sem desvirtuar o personagem como Jared Leto, o Coringa de Phoenix é único e certamente está no panteão de melhores interpretações do personagem.

Obviamente é complicado comparar com a versão de Ledger, a mais querida pelos fãs. No entanto, pode-se dizer com tranquilidade que a nova versão alcança seu objetivo ao trazer uma faceta nova do personagem sem desconfigurá-lo.

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Um vilão Inimputável?

Coringa não é um filme tão fácil cuja moral divide-se entre bem e mal. E isso é o que o torna tão fascinante.

Filmes focados no vilão podem ser capciosos. Ao tentar contar a história de um personagem, é preciso que haja um envolvimento, que o público se afeiçoe ao protagonista. No caso dos vilões, este nível de afeto precisa estar controlado. O público deve entender as motivações em algum ponto, mas ainda se chocar com as atitudes tomadas.

No caso em questão, é ainda mais complicado. Sabemos que Coringa é um vilão extremamente perverso, sádico e que já foi responsável por diversas atitudes grotescas pelo simples prazer de praticá-las. Certamente não seria o tipo de personagem que gostaríamos de simpatizar.

Coringa, no entanto, consegue trilhar seu caminho por esta linha tênue em sua maior parte. Obviamente, em diversos momentos nos afeiçoamos com o personagem de Athur Fleck e a sua situação, mas não deixamos de nos chocar com suas atitudes à medida em que estas se tornam cada vez mais chocantes.

Contudo, existe um lado do filme que acaba por “legitimar” algumas atitudes do herói e até mesmo subverter alguns elementos basilares do Universo DC.

É interessante como uma lição de moral verdadeira e que se aplica no mundo atual acaba por ser transmitida por um dos vilões mais perversos da história dos quadrinhos. É um paradoxo apaixonante.

Conclusão

Coringa é um filme mais simples e mais profundo do que a maioria dos longas de super-heróis. Ao tentar distanciar-se do padrão do gênero e aproximar-se do estilo consagrado de diretores como Scorsese, Todd Phillips entrega uma obra diferente, renovadora e impactante.

Com uma obra pontual e fechada, o longa cumpre o seu propósito e consegue trazer uma nova nuance de um personagem tão icônico. Não há, portanto, qualquer necessidade de sequência, expansão de universo ou spin-off. É a graphic novel do Todd Phillips sobre o Príncipe Palhaço do Crime.

Seja você fã de filmes de heróis ou não, Coringa é uma opção que transcende o gênero e desafia o seu expectador, ficando em sua mente por muito tempo após o final da sessão.

Que a Warner siga esse estilo de cinema e encontre seu formato em vez de seguir replicando!

Coringa chega aos cinemas no dia 03 de Outubro.

“I said, that’s life (that’s life) and as funny as it may seem
Some people get their kicks
Stompin’ on a dream
But I don’t let it, let it get me down
‘Cause this fine old world it keeps spinnin’ around”

Pedro Cardoso

Editor do Capacitor, apaixonado por games, filmes e literatura sci-fi/fantástica.

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